Como fazer uma boa confissão?
Na luta contra o pecado, uma das
grandes armas de auxílio do cristão é o sacramento da Penitência. Quando, por
infelicidade, o homem cai no abismo do pecado, é por meio da Confissão que ele
se reconcilia com a Igreja; é através da acusação aos sacerdotes,
"embaixadores em nome de Cristo"01, que ele recupera a
graça de Deus.
Para colher os frutos deste sacramento,
além do simples perdão dos pecados, é necessária a colaboração do homem. Os
sacramentos, enquanto instrumentos de Deus para aplicar os méritos de Cristo,
aumentam a graça de forma infalível (ex
opere operato), mas, na prática, o seu efeito santificador é proporcional às
disposições interiores da alma (ex
opere operantis). Se uma pessoa que se confessa quotidianamente não consegue notar
nenhum progresso na vida espiritual ou nenhum sinal de que está trilhando a
senda da santificação, isto pode acontecer não por causa da ajuda divina, mas
pela imperfeição de suas próprias disposições.
Assim
como o sol é um só, mas atua diferentemente quando seus raios caem no metal ou
no barro, a graça de Deus também atua sobre todos aqueles que a pedem, mas
alguns, abrindo-se mais à Sua ação, se santificam mais que outros. O calor que o
sol provoca é diferente não por um defeito seu, mas justamente porque age sobre
materiais diferentes. Na eficácia do sacramento o homem não influi como causa,
mas como recipiente.
Quanto às disposições interiores do penitente, elas
dividem-se em habituais e atuais.
As primeiras resumem-se, de modo
prático, às três virtudes teologais. Quem quer que se achegue ao tribunal da
Confissão deve aproximar-se dele com espírito de fé, afinal, embora vá acusar
seus pecados a um homem, pecador como ele, quem age na absolvição dos pecados e
aconselha o penitente é o próprio Cristo. "Só Deus perdoa os
pecados", indica o Catecismo da Igreja Católica. No entanto, "em
virtude de sua autoridade divina, [Ele] transmite esse poder aos homens para
que o exerçam em seu nome"02. Ao entrar no
confessionário para ouvir os fiéis, também os sacerdotes deveriam tomar
consciência da dignidade deste "ministério da reconciliação"03 exercido por
ele in persona Christi.
O
penitente deve ainda se aproximar deste sacramento com a máxima confiança
(esperança) de ser perdoado – contanto que esteja verdadeiramente arrependido
de suas faltas – e com amor de Deus, sem o qual ele não pode se desapegar de
seus pecados, por leves que sejam.
As disposições atuais para receber este sacramento
são aquelas necessárias ao penitente à hora da acusação. O que é necessário
para se confessar – e se confessar bem? O padre Antonio Royo Marín escreve:
"Em
primeiro lugar, acercar-nos-emos do tribunal da penitência em cada ocasião como
se aquela fosse a última confissão de nossa vida, como preparação imediata para
o viático e o juízo de Deus. Deve-se combater com energia o espírito de rotina,
não se confessando por mero costume de fazê-lo a cada tantos dias, mas
empregando o máximo empenho em conseguir, com a graça de Deus, uma verdadeira
conversão e renovação de nossa alma."04
A primeira das disposições atuais
tratadas pelo padre Royo Marín em sua obra é o exame de consciência. Quem está
habituado a realizar esta prática todos os dias05, não sentirá muitas
dificuldades em examinar-se antes da confissão, já que terá sempre diante de si
as faltas cometidas, prontas a serem contadas ao sacerdote. À hora do exame, é
importante não desculpar os próprios defeitos, tentando atribuir a causa dos
pecados a fatores externos, nem inventar pecados que sequer foram cometidos –
prática comum de almas escrupulosas. Ao mesmo tempo, quanto às faltas veniais,
não se deve perder tempo com detalhes, mas, sim, procurar a raiz dos problemas,
a fim de que o confessor não apenas perdoe os pecados, mas indique os remédios
para a cura da doença espiritual que a pessoa apresente.
Sem
a contrição de coração o sacramento da Confissão sequer é válido. Santo Tomás
escreve que "a matéria próxima deste sacramento são os atos do penitente,
que têm, por sua vez, como matéria os pecados arrependidos e confessados e
pelos quais cumpre uma satisfação. Daí se segue que a matéria remota da
penitência são os pecados, não enquanto desejados na intenção, mas enquanto
devem ser detestados e destruídos"06. Ora, sem
"detestar" os pecados cometidos, não há matéria para este sacramento.
Quem se aproxima do tribunal da Penitência sem arrependimento, por mais que
receba a absolvição, não é perdoado.
O motivo pelo qual o pecador se arrepende também é
importante: não pode ser por qualquer coisa natural – por uma doença física ou
pela vergonha diante dos homens, por exemplo –, mas por uma aflição de origem
sobrenatural: o indivíduo arrepende-se ou porque perdeu o Céu e mereceu as
penas eternas do inferno (atrição) ou porque, tomando consciência do grande
amor com que foi amado, foi ingrato e perdeu Deus, o sumo Bem (contrição
perfeita).
Tanto
a atrição quanto a contrição perfeita são válidas como arrependimento, mas quem
quer que deseje trilhar o caminho da santidade não deve se contentar com a
senda do temor.
"Nada,
pois, há de procurar com tanto empenho a alma que queira santificar-se como
esta intensidade de contrição nascida do amor de Deus, da consideração de sua
infinita bondade e misericórdia, do amor e dos sofrimentos de Cristo, da
monstruosa ingratidão do pecador para com um Pai tão bom, que nos tem enchido
de incompreensíveis benefícios etc. Mas, bem persuadida de que esta graça da
perfeita e intensa contrição é um dom de Deus que só se pode impetrar por meio
da oração, humilhar-se-á profundamente diante da divina Majestade, implorando-a
com insistência, por intercessão de Maria, mediadora de todas as graças."07
As pessoas tendem a confundir esta
contrição perfeita com um sentimento, com uma expressão física de comoção ou de
dor, mas isto é um aspecto meramente acidental do arrependimento. "Não é
necessário manifestar exteriormente a contrição interna por meio de suspiros,
lágrimas, etc.: tudo isto pode ser sinal de contrição, não é, porém, sua essência.
A essência da contrição está na alma, na vontade, em afastar-se deveras do
pecado e converter-se para Deus"08. Assim, só Deus, que
perscruta o coração dos homens, é capaz de ver a verdadeira contrição.
Tal é a importância dessa disposição
interior que o Doutor Angélico adverte ser tanto maior a graça que se alcança
após a absolvição quanto mais intensa for a contrição forjada pelo penitente.
"A intensidade do arrependimento do penitente é, às vezes, proporcionado a
uma maior graça que aquela da qual caiu pelo pecado; às vezes, a igual; e, às
vezes, a menor. E pela mesma razão o penitente se levanta às vezes com maior
graça do que tinha antes; às vezes, com igual; e, às vezes, com menor"09, escreve. Por isso,
diz o pe. Royo Marín, "é (...) de grande importância procurar a máxima
intensidade possível no arrependimento e na contrição para lograr recuperar o
mesmo grau de graça ou quiçá um maior do que o que se possuía antes do
pecado"10.
Também não é possível obter o perdão
dos pecados sem o propósito firme. Mais do que tornar ineficaz a recepção do
sacramento, a sua falta acaba por invalidar a absolvição. Afinal, se a pessoa
se acusa ao sacerdote mas não está disposta a renunciar ao pecado, deixando de
cometê-lo, qual o sentido de seu arrependimento? O padre Royo Marín alerta
ainda que, além de um "propósito geral de não
voltar a pecar", é preciso que o penitente tome "uma resolução clara,
concreta, enérgica, de empregar os meios para evitar tal ou qual falta ou se
adiantar na prática de uma determinada virtude"11.
Considera-se, enfim, a confissão vocal.
Santo Tomás resume, em alguns versos, quais devem ser as qualidades da boa
acusação: Sit simplex, humilis confessio, pura, fidelis, atque vera, frequens,
nuda, discreta, libens, verecunda, integra, secreta, lacrimabilis, accelerata,
fortis et accusans, et sit parere parata. – Seja simples, humilde a confissão,
pura, fiel, frequente, clara, discreta, voluntária, verecunda, íntegra, secreta,
lacrimosa, pronta, forte, acusadora e disposta a obedecer12. Destas dezesseis
qualidades, destaque-se os termos "humilde" – pois o penitente deve
colocar-se diante de Deus como quem não está merecendo nada –,
"íntegra" – pois os pecados mortais devem ser confessados
integralmente e na maior precisão numérica possível – e "frequente" –
pois, sendo um meio eficacíssimo de santificação, deve ser procurado
continuamente, assim como o procuraram os grandes santos.
Por fim, chega-se à satisfação
sacramental. Embora as faltas do penitente sejam plenamente perdoadas já na
acusação contrita, restam a pena temporal devida pelo pecado e a enfermidade
que deve ser remediada pelo confessor. É neste departamento que cabem as
exortações à terapia das doenças espirituais13. É importante que o
fiel cumpra atentamente e o mais depressa possível a penitência imposta pelo
sacerdote, já que, diz o Doutor Angélico, "nela opera o poder das chaves,
de sorte que tem mais valor para expiar o pecado que se o homem realizasse a
mesma obra por seu próprio arbítrio"14.
Padre Paulo Ricardo
Referências
1.
2 Cor 5, 20
2.
Catecismo da Igreja Católica, parágrafo
1441
3.
2 Cor 5, 18
14. Quaestiones de quodlibet 3, a. 28 apud
Teología de la Perfección Cristiana, edição em PDF, p. 420
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